O Encontro Marcado

Fitaram-se por alguns instantes e ficaram encabulados, afinal olhares trocados com estranhos, mesmo que por segundos, causa um certo constrangimento.

Viraram-se cada um para seu lado e continuaram a pesquisar nas prateleiras da livraria, olhando tudo,  sem nada encontrar.

Aquele esbarrão ao acaso não estava programado e a incomodou.  Ela precisava de uma literatura que a ajudasse a compreender melhor o sentido da vida, então continuou a vasculhar. Ele, bem, não se sabe ao certo o que procurava.

Os corredores estavam vazios, quase hora de fechar o shopping, se não encontrasse o que procurava, teria de passar mais uma noite com seus vagos pensamentos, divagando sobre o que pouco compreendia. Mas ainda não seria naquela noite que ela encontraria o que vinha procurando, pois aquele cara a havia desconcentrado e tinha medo de virar um novo corredor e ter de encará-lo novamente.

Resolveu então ir embora, adiaria sua procura, pois nem estava mesmo certa do que queria encontrar. Saiu da livraria às pressas, meio eufórica e assustada, parecia ter medo de tudo e de todos, desconfiada olhava para os lados. Antes de chegar à porta viu o rapaz no caixa, com uma revista enrolada, esperando para ser atendido. Antes mesmo que ele percebesse seu olhar, ela apressou-se em sair.

Ufa!!!!... pensou... não estou muito preparada para estas emoções fortes de novo!

À noite estava irrequieta, o sono não vinha, lembranças indesejáveis chegavam à mente. Não queria pensar, mas fechava os olhos e tudo voltava. Uma dor aguda no coração persistia e acabava dormindo pelo cansaço, olhos de ressaca cheios de lágrimas.

Os dias se passaram e lembrou-se ainda não ter encontrado o tal livro, de vital importância para o seu conhecimento, tão necessário naquela sua nova fase. Resolveu-se então à tardinha depois do trabalho, ir à livraria novamente. No caminho do shopping lembrou-se daquele esbarrão ao acaso que tanto a havia incomodado, decidiu ir à outra livraria, afinal, havia passado muitas vezes naquela e parecia não ter aquilo que vinha procurando  há muito tempo.

Conhecia um sebo de livros no centro da cidade, decidiu-se ir até lá.  Subiu no carro e seguiu em frente. O trânsito estava irremediavelmente parado, incômoda aquela sensação de impotência, mas fazer o que, tinha mesmo de ficar e esperar.

Os minutos se passavam e os carros não se mexiam, alguns começaram a buzinar, irritada pensava na falta de educação dos motoristas. Eis que todos começaram a se movimentar,

pisou então no acelerador e investiu, qual não foi sua surpresa, alguém atravessava a rua correndo. Assustada brecou forte e ficou quase que em estado de choque, devido ao susto. O rapaz percebendo o ocorrido foi até o vidro do carro.

- Desculpe, disse ele debruçado no vidro.

- Você novamente! Vê se dá próxima vez toma mais cuidado, podia tê-lo ferido.

- Não se preocupe, você já o fez!

Um momento de silêncio... ambos se olharam bem dentro dos olhos...

Os carros à sua frente começaram a sair e ela engatou a marcha seguindo sem nada dizer.

Resolveu não mais procurar o livro, não tinha cabeça para nada depois disso, melhor mesmo seria repensar os seus dias e colocar um ponto final na história mal resolvida de sua vida.

Chegou em casa quase uma hora depois, ficou vagando pelas ruas, imaginando qual seria sua atitude diante de tudo que vinha sentindo. Pegou o telefone, relutou ao discar, enganou-se nos números e voltou a tentar. Chamava do outro lado, chamava, chamava e ninguém atendia, desistiu então.

Sentou-se no sofá, suas mãos estavam úmidas e nervosa acendeu um cigarro, fuga imbecil que buscava para suas horas de nervosismo descontrolado.

Quisera ter se desculpado a tempo, ter feito as malas e ido embora sem explicação não tinha sido uma atitude condizente com seu jeito costumeiro de agir, mas não havia muito mais a fazer, sabia que já havia tentado um entendimento várias vezes, todas nulas.. Foi uma atitude pensada não poderia se arrepender, deveria assumir e pronto.

Voltou aos seus escritos e resolveu então anotar suas impressões sobre o que tinha vivido até aquele momento. Não seria uma romance desta vez, suas prateleiras já estavam empilhadas destes textos, mas não conseguia se concentrar, sabia que nada tinha sido tão ao acaso, quase o atropelara nesta tarde, havia tido várias chances de se explicar, o destino havia lhe reservado isto, mas abrira mão de todas elas.

Quem sabe poderia encontrá-lo novamente na livraria amanhã.  Quem sabe teria uma nova chance, apenas mais uma... e quem sabe coragem.


LIVRO Intensa (contos)
 


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