Dia do Conto - Fuga Silenciosa



O brilho da luz passa por entre as frestas, busca um perfume de lavanda, aroma de frescor. Espreita a tênue sala, que no silêncio permanece como se o tempo tivesse adormecido.
Os raios de sol seguem determinados a alcançar, sem constrangimento, o assoalho de madeira casa à dentro... 
Vai entrando... o vento faz tremular as cortinas e assovia desavergonhado. Chama por alguém, parece anunciar um nome...
Ela em cada manhã se levanta sonolenta, caminha devagar pelo quarto esfregando os olhos. Se enrola numa das cobertas e segue arrastando-a pelo chão, atravessa uma pequena saleta e chega até a varanda; fazia isso todos os dias. Abria as portas, grandes portas de vidro. Recebia o abraço frio das manhãs e ao se arrepiar sentia que estava sendo inseminada pela energia da vida.
Tomava seu café numa grande caneca azul, presente de sua mãe quando era pequena. Tinha vários hábitos: Fazia caminhadas antes do almoço e no final da tarde. Ficava horas admirando o lago de pequenas ondas, que o vento fazia balançar. Não tinha vício algum a não ser o da leitura. Quando pegava num livro, esquecia-se de tudo.
Vivia sozinha, não se sabia se por opção. Recebera uma herança de sua avó mais querida, sofrera muito com sua morte, e vivia só desde então.
Naquela manhã, porém, as janelas não foram abertas e parece que há vários dias que elas se mantinham fechadas.
No final de uma tarde, o sol não conseguia entrar, mesmo depois de várias tentativas. Deu a volta na casa com impaciência peculiar e se espreitou na janela dos fundos. Com ele seguia o vento, agora mais forte que nunca, nervoso e angustiado. Conseguiram finalmente chegar ao quarto e, para surpresa de ambos, encontraram um corpo caído no chão.
Juntos tentavam animar a companheira ausente, mas em vão. O sol deveria arder-lhe a pele branca, mas ela não se movia. O vento sacudia-lhe os cabelos e o tecido de suas vestes, mas ela não podia se dar mais conta do esforço dos amigos. Exalava-se um forte cheiro no ar, devia estar caída ali por dias... 
Abandonara a vida e seus fiéis companheiros. Partiu sem um adeus, a razão ficara desconhecida. O anoitecer chegou e a cobriu com um manto breve, sem tempo para uma despedida. 

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